“O Filho Eterno”: E se fosse a mãe?

mãe e filho sentados numa escadaria, mãe olha para o filho, com um dedo próximo à boca.

Por Claudio Blanco

E se fosse a mãe que, diante do nascimento do filho com Síndrome de Down, entrasse em conflito por não ser aquele o filho idealizado por ela? E se fosse a mãe que visse o filho como um obstáculo aos seus planos de tornar-se escritora? E se fosse a mãe, que não conseguindo “consertar” o filho, optasse por se afastar da vida familiar? E se fosse a mãe, que ao ver os seus sonhos frustrados, se permitisse buscar a ideia de felicidade, deixando o filho aos cuidados do pai? E se fosse a mãe a trair?

Será que teríamos tanta compreensão e empatia com as fraquezas dessa mãe?

A triste realidade é que ainda são muitos os casos em que o homem delega à mulher a criação de uma criança com Síndrome de Down, a exemplo da história narrada em “O Filho Eterno”. Independente de classe social, ao homem é facultada esta liberdade. Ainda que todos o reprovem no discurso, há um véu de aceitação por parte da sociedade, que não o recrimina de acordo com os danos do seu ato, sem nem entrar na questão legal.

Não raro ouvimos um pai dizer que está ajudando a mulher com o filho. Ou seja, a responsabilidade da criação é da mulher. Ao homem caberia o papel de coadjuvante, alguém com uma participação menor naquela história familiar, que não veria nada de mais em sair dela, porque a mulher estaria ali, forte e segura, para o que der e vier.

Se um homem troca as fraldas, dá banho, prepara a comida, leva para passear e coloca pra dormir seu filho, é imediatamente identificado como um pai “exemplar”, “um santo”. Se a mulher faz o mesmo, não há nenhum adjetivo que acompanhe o substantivo “mãe”. Ela não faz mais do que aquilo que é esperado dela.

Frequentemente nós deixamos para nossas mulheres algo a fazer para os nossos filhos. Elas têm mais jeito, mais prática, aprenderam desde cedo a cuidar de filho, são mais atentas, e qualquer outra desculpa que se invente na hora.

Se queremos que a realidade seja outra, precisamos rever os valores com que nossos filhos são criados, devemos combater as ideias que diferenciam o papel do homem e da mulher nos cuidados de um filho, mas, sobretudo, precisamos mudar a nós mesmos, pais e mães, para que não perpetuemos conceitos que permitam que um pai abandone seu filho.

Claudio Blanco – Membro do grupo de acolhimento de pais AcolheDown.